Cachorro de dondoca tem missa velada na igreja da Pituba

Ela tinha um filho. Pequeno, peludo e com cauda. Entre afagos, declarava ser uma relação de outra vida, que um havia nascido para o outro, enquanto repetia pela enésima vez nunca ter conhecido alguém como ele. Passeavam juntos durante a tarde, de quinze em quinze dias, ela o deixava na tosa e ia para depilação. Era unha e carne. Um dia, Peter Silveira, como foi nomeado por sua mãe, recebeu o chamado do todo poderoso e bateu a caçuleta. O céu ficou cor de chumbo e uma grande chuva caiu dos olhos daquela paquita da terceira idade. A comoção foi geral no lar da família Silveira, uma perda irreparável. Eis que surge uma questão: Onde enterrar Peter? Ele não chegou a declarar alguma preferência, mas a convalecida mãe considera cremação uma tendência que chegou para ficar, além de ser super higiênico. Suas cinzas foram arremessadas metade no jardim da casa principal e a outra metade no Litoral Norte que ele tanto amava. Uma semana após Peter juntar as patas, o clã Silveira se encontrava na igreja da Pituba numa missa em homenagem ao ente querido. Frei Paulo, do alto de sua soberania, gesticulava reluzindo suas jóias, reverberando sua renomada oratória in memoriam de Peter Silveira.
Sempre achei o rito católico bonito, mas sinto falta de uma certa ação (ou suspense, vai saber...). Imaginem se Mrs. Silveira recorresse a uma sensitiva em busca de contato com o falecido Peter. Tudo seria mais animado. A sala em penumbra, o copo d’água sobre a mesa, todos tensos, mãos dadas em busca de força e unidade... De repente, a clarividente arregala o olho, faz um bico e começa a latir. Mrs. Silveira de imediato reconhece a saudação e começa a falar aquele dialeto débil mental, que se usa com bebê e cachorro... A sensitiva se joga no chão e vira a barriga para cima pedindo carinho... Entre lambidas e latidos os créditos subiriam...